Ética do gratuito

Somos uma empresa cidadã criada por dois jovens empreendedores já lá vão 19 anos. Na cultura da empresa esteve sempre o desenvolvimento da região de Trás-os-Montes e Alto Douro onde a empresa foi sedeada. Por isso, voluntariamento realizamos acções, eventos e atividades de apoio à comunidade, focalizados no empreendedorismo e na auto-determinação territorial.

Como empreendedores sabemos que muitas das vezes não temos recursos financeiros ou tempo para procurar especialistas que nos respondam às questões e dúvidas que temos sobre as ideias que gostaríamos de implementar ou sobre a actividade das startup’s que gerimos. Por isso, estes eventos, projetos e programas são gratuitos.

Este gratuito é um gratuito de qualidade, é o melhor que sabemos fazer. Se decidimos oferecer um serviço gratuito, somos profissionais e esforçamo-nos para que este tenha o máximo de qualidade, não faltamos e somos pontuais. Este é o principio do respeito pelos outros e esta é a premissa base da ética do gratuito que aqui defendemos. Se decidi participar tenho direitos e deveres. Não tenho outra hipótese a não ser respeita-la.

Tudo começa com um acto de liberdade:

- A SPA | Arregaçar as Mangas decidiu ter uma oferta gratuita, de qualidade, à comunidade.

- A pessoa decidiu inscrever-se ou participar nessa oferta.


É neste acto fundador, nesta acção primordial, que reside o fundamento desta ética. A SPA | Arregaçar as Mangas não era obrigada a ter uma oferta para mim, nem eu era obrigado a inscrever-me. Mas assim que formulou a oferta e assim que eu aceitei participar, inicia-se uma relação de partes livres, com direitos e deveres, desde logo legais, mas muito mais importantes que estes, éticos.

A SPA | Arregaçar as Mangas tem o dever de me oferecer um serviço de qualidade, em respeitar-me como pessoa, em salvaguardar a minha informação, em perguntar a minha opinião, em ouvir-me e em fazer uso dessa informação para a sua evolução, para a sua melhoria, por forma a que eu continue a ter um serviço de qualidade.

Por sua vez eu tenho a obrigação de honrar o meu compromisso, estar presente, chegar a horas, participar, colaborar com o outros, disponibilizar-me para aprender e para ensinar. Para partilhar.

Sobre o valor do gratuito

É este gratuito sinónimo de coisa que não tem valor, ou que só é gratuito porque ninguém compra? Não. É gratuito por desenho, por modelo de negócio, por natureza (como é a Google). E sendo gratuito é de excelente qualidade, é o melhor que cada membro da comunidade consegue fazer, pessoas que tem empreendimentos realizados e uma história de vida. Pessoas cuja sua profissão é usar este conhecimento, que vivem dele. Simplesmente no contexto da SPA | Arregaçar as Mangas, disponibilizam de forma gratuita, porque estão na comunidade, porque estão ao abrigo da lei 'eu dou e recebo'. Dou do meu tempo e saber e recebo do tempo dos outros, saber dos outros. Porque me promovo e a minha actividade. Porque ajudo e sou ajudado.

Ser gratuito é sinónimo de qualidade. Do melhor que somos capazes em cada momento. Só assim estamos a altura de ajudar cada pessoa a construir o seu futuro, independente do seu poder económico, literacia, escolaridade, ou qualquer outro atributo.

Sobre a legitimidade da falta

Claro que é legitimo faltar. O meu filho ficou doente e tenho que ir busca-lo. Cai e parti a perna. Fui atropelado. Um cliente ligou-me e tenho que ir em seu auxílio. Claro que é legítimo faltar. Mas esta legitimidade não me desresponsabiliza. É exactamente ao contrário. Porque quero ser respeitado tenho que respeitar. Tenho que respeitar aquele que em vez de estar com os seus filhos ou com os seus amigos, decidiu disponibilizar do seu tempo para partilhar algo comigo que eu quero saber, por liberdade de escolha. Ele, generoso, partilha comigo e faz de forma gratuita. Eu, livre, decidi que me interessava. É enorme a responsabilidade, maior do que se eu tivesse pago. Se tivesse pago a pessoa teria a recompensa monetária. Não teria a recompensa do reconhecimento. Aqui, não há a monetária, só a do reconhecimento. Se não venho, impossibilito a pessoa de ter a sua recompensa. Tão generosamente partilha comigo, eu aceito e ainda por cima não lhe recompenso. Não pode esta ser uma expressão de uma boa premissa ética.

Acresce o facto de, como as inscrições são limitadas, pelo imperativo de tempo e qualidade de serviço, ao inscrever-me limito o acesso a outro, que tem igual direito ao meu, apenas o decidiu exercer mais tarde. Se me inscrevo e não compareço, ofendo todos os outros que queriam estar presentes e não podem porque eu exerci a minha liberdade, mas não estive há altura da responsabilidade que esta me conferia. Se o outro faz o mesmo, eu nunca me vou conseguir inscrever ou estar presente.

No caso de falta, e sempre que possível, é informar a SPA | Arregaçar as Mangas por forma a que esta possa promover as diligências para que outro entre em meu lugar. A razoabilidade e o bom senso ponderam todos estes pressupostos. Afinal somos humanos. Mas tal facto não nos isenta da responsabilidade. Exerce-la com sabedoria é a arte de todas as pessoas que se respeitam a si mesmas.

Por ser legitimo faltar, só me devo inscrever quando tenho boas garantias que vou conseguir estar presente (sabemos que não existe a certeza absoluta!). Em dúvida devo esperar, por forma a não limitar o acesso ao outro.

Sobre chegar a atrasado

Como o serviço é de qualidade, como é gratuito e como a falta existe, se chegar atrasado, o mais provável é a acção já ter começado, irei perturbar os trabalhos, não devo tirar o proveito esperado e muito provavelmente perco o meu lugar caso haja outras pessoas em espera. É legitimo, mas o atraso deve ser aceitável (na fronteira dos 15 minutos). Importa perceber que se começar tarde, acaba tarde, e todos tem compromissos a honrar. A interacção social obriga a esta responsabilização que os horários são para cumprir, com a flexibilidade necessária para o imprevisto mas sempre no respeito por cada uma das pessoas



* adaptado da Etica do Gratuito da Cooperativa João sem medo.

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